Sobre voltar
No ano de 2000, virava-se um século, virávamos também um milênio, era uma época de mudança, de sonhos mas também de medos.
No ano de 2000, decidi sair do meu país, do meu Alentejo, da minha terra natal, Ficalho. É estranho porque no ano anterior de 1999, tinha a certeza que nunca ia sair para lado nenhum, mas agora quase por arte de bruxaria, a decisão estava tomada, com base em muitas coisas, ou apenas numa loucura da juventude, já não sei bem, mas a verdade é que estava tomada.
O plano era simples, nove meses por terras helvéticas, aprender uma lingua nova, fazer snowboard e ganhar algum dinheiro. Depois era voltar e fazer vida onde estava destinado a viver, em Ficalho.
O plano falhou!
Não que tenha falhado de uma maneira negativa, a verdade é que nem sempre um plano falhado é negativo, pois como falhou nunca saberemos como seria se tivesse funcionado. Ficamos assim apenas com a certeza, de que não correu como planeado, e cabe-nos a nós então seguir este novo caminho, cheio de possibilidades, que apareceram com o falhar de um plano.
Levei vinte e dois anos a percorrer o meu caminho, a abraçar oportunidades, umas com desfechos mais felizes que outras, mas todas igualmente importantes no meu crescer.
E assim tantos anos depois, a minha mulher, que partilha o amor incondicional pela minha terra e pelas minhas gentes, convenceu-me que estava na hora. Na hora de voltar, onde o caminho começou.
Fazia todo o sentido, este povo tinha-me dado as bases para ser quem sou, e queria voltar ainda com idade e energia para o desfrutar, mas também com idade e energia para dar de volta, fosse o que fosse que conseguisse dar.
Estranho foi quando contamos ao mundo que iriamos voltar, e tal noticia foi recebida com duvidas e preocupação.
“O que vens fazer para cá?”
“Aqui não se passa nada!”
“Vais-te aborrecer!”
“É um monte, estamos ao abandono!”
É-me cada vez mais claro, que quem não sai do sol, não lhe sabe dar o valor, e que que só se aborrece quem é aborrecido.
Mas depois de vinte e tal anos fora, como seria voltar?
“Ficalho já não é o que era, quando abalaste.”
“Isto é muito bonito de ferias.”
A verdade, é que voltamos sem medo, e um ano depois não nos aborrecemos nem um minuto que seja, na verdade gostava de ter tempo para me aborrecer. Ficalho já não é o que era quando abalei, mas eu também não o sou, e voltar foi tão fácil, porque eu nunca parti. Foi umas das coisas que o meu caminho me ensinou, a presença não é necessariamente física.
Eu senti a minha terra a cada minuto da minha ausência, mas também me fiz sentir, e na hora de voltar, senti que esperava por mim.
Texto de: Francisco Mendes